"Muito cedo na minha vida ficou tarde demais.
Quando eu tinha dezoito anos já era tarde demais. Entre dezoito e vinte e cinco
meu rosto tomou uma direção imprevista. Aos dezoito anos envelheci. Não sei se
é assim com todos, nunca perguntei. Creio que alguém já me falou dessa
investida do tempo que nos acomete às vezes na primeira juventude, nos anos
mais festejados da vida. Esse envelhecimento foi brutal. Eu o vi apossar-se dos
meus traços um a um, alterar a relação que havia entre eles, aumentando o tamanho
dos olhos, fazendo mais triste o olhar, mais definida a boca, marcando a testa
com rugas profundas. Não tive medo e observei o envelhecimento do meu rosto com
o interesse que teria dedicado a uma leitura. Sabia também que não estava
enganada, que um dia ele ficaria mais lento, tomando seu curso normal. As
pessoas que me haviam conhecido à época de minha viagem à França, quando eu
tinha dezessete anos, ficaram impressionadas quando me reviram dois anos mais
tarde. Foi o meu rosto. Envelheceu também, é claro, mas relativamente menos do
que devia. Tenho um rosto lacerado por rugas secas e profundas, sulcos na pele.
Não é um rosto desfeito, como acontece com pessoas de traços delicados, o
contorno é o mesmo mas a matéria foi destruída. Tenho um rosto destruído."
(O amante - Marguerite Duras)
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