o que fica?
fica eu mesma com as questões que achei que o outro, que chamei de amor e que, por muito tempo, começou a ser uma extensão da minha consciência narcisa, minha prótese, fosse resolver para mim.
já faz um tempo que não consigo superar as "simbioses" e "máquinas celibatárias", meus esconderijos.
"o que
é uma mulher? Juro que não sei. E duvido que vocês saibam. Duvido que alguém
possa saber, enquanto ela não se expressar em todas as artes e profissões
abertas às capacidades humanas. E de fato, essa é uma das razões pela quais
estou aqui, em respeito a vocês, que estão nos mostrando com suas experiências
o que é uma mulher, que estão nos dando, com seus fracassos e sucessos, essa informação
da maior importância." (WOOLF, 1931)
24 abril 2014
20 abril 2014
uma arte
"A arte de perder não é nenhum mistério;
tantas coisas contêm em si o acidente
de perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
a chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Depois perca mais rápido, com mais critério:
lugares, nomes, a escala subseqüente
da viagem não feita. Nada disso é sério.
Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi duas cidades lindas. E um império
que era meu, dois rios, e mais um continente.
tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
— Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério."
(Elisabeth Bishop)
tantas coisas contêm em si o acidente
de perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
a chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Depois perca mais rápido, com mais critério:
lugares, nomes, a escala subseqüente
da viagem não feita. Nada disso é sério.
Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi duas cidades lindas. E um império
que era meu, dois rios, e mais um continente.
tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
— Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério."
(Elisabeth Bishop)
18 abril 2014
"Preciso falar de
uma experiência muito esquisita que me aconteceu como romancista. E, para
entender, primeiro vocês têm de tentar imaginar o estado de espírito de um
romancista. Acho que não estou revelando nenhum segredo profissional ao dizer
que o maior desejo de um romancista é ser o mais inconsciente possível. Ele
precisa se induzir a um estado de letargia constante. Ele quer que a vida siga
com toda a calma e regularidade. (...) para que nada venha a romper a ilusão em
que vive – para que nada incomode ou perturbe os misteriosos movimentos de
farejar e sentir ao redor, os saltos, as arremetidas e as súbitas descobertas
daquele espírito tão tímido e esquivo, a imaginação. Desconfio que seja o mesmo
estado de espírito para homens e mulheres. Seja como for, quero que vocês me
imaginem escrevendo um romance em estado de transe. Quero que vocês imaginem
uma moça sentada com uma caneta na mão, passando minutos, na verdade horas, sem
molhar a pena no tinteiro. Quando penso nessa moça, a imagem que me ocorre é
alguém pescando, em devaneios à beira de um lago fundo, com um caniço na mão.
Ela deixava a imaginação vaguear livre por todas as pedras e fendas do mundo
submerso nas profundezas de nosso ser inconsciente. Então vem a experiência, a
experiência que creio ser muito mais comum com as mulheres do que com os homens
que escrevem. A linha correu pelos dedos da moça. Um tranco puxou a imaginação.
Ela tinha sondado as poças, as funduras, as sombras onde ficam os peixes
maiores. E então bateu em alguma coisa. Foi uma pancada forte. Espumarada,
tumulto. A imaginação tinha colidido numa coisa dura. A moça foi despertada do
sonho. E de fato ficou na mais viva angústia e aflição. Falando sem metáforas,
ela pensou numa coisa, uma coisa sobre o corpo, sobre as paixões, que para ela,
como mulher, era impróprio dizer. E a razão lhe dizia que os homens ficariam
chocados. Foi a consciência do que diriam os homens sobre uma mulher que fala
de suas paixões que a despertou do estado de inconsciência como artista. Não
podia mais escrever. O transe tinha acabado. A imaginação não conseguiu mais
trabalhar. Isso creio que é uma experiência muito comum entre as mulheres que
escrevem – ficam bloqueadas pelo extremo convencionalismo do outro sexo. Pois,
embora sensatamente os homens se permitam grande liberdade em tais assuntos,
duvido que percebam ou consigam controlar o extremo rigor com que condenam a
mesma liberdade nas mulheres."
(Profissões para mulheres e outros artigos feministas. Virginia Woolf. pp. 15-16)
09 abril 2014
"Muito cedo na minha vida ficou tarde demais.
Quando eu tinha dezoito anos já era tarde demais. Entre dezoito e vinte e cinco
meu rosto tomou uma direção imprevista. Aos dezoito anos envelheci. Não sei se
é assim com todos, nunca perguntei. Creio que alguém já me falou dessa
investida do tempo que nos acomete às vezes na primeira juventude, nos anos
mais festejados da vida. Esse envelhecimento foi brutal. Eu o vi apossar-se dos
meus traços um a um, alterar a relação que havia entre eles, aumentando o tamanho
dos olhos, fazendo mais triste o olhar, mais definida a boca, marcando a testa
com rugas profundas. Não tive medo e observei o envelhecimento do meu rosto com
o interesse que teria dedicado a uma leitura. Sabia também que não estava
enganada, que um dia ele ficaria mais lento, tomando seu curso normal. As
pessoas que me haviam conhecido à época de minha viagem à França, quando eu
tinha dezessete anos, ficaram impressionadas quando me reviram dois anos mais
tarde. Foi o meu rosto. Envelheceu também, é claro, mas relativamente menos do
que devia. Tenho um rosto lacerado por rugas secas e profundas, sulcos na pele.
Não é um rosto desfeito, como acontece com pessoas de traços delicados, o
contorno é o mesmo mas a matéria foi destruída. Tenho um rosto destruído."
(O amante - Marguerite Duras)
17 fevereiro 2014
02 fevereiro 2014
A degradação de ser escravo só se equipara à degradação de ser senhor
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Em 1920, o romancista inglês Arnold Bennett publicou uma coletânea de ensaios chamada "Nossas mulheres: capítulos sobre a discórdia entre os sexos", na qual defendia que "as" (artigo definido e no plural, enquanto o título apresenta o pronome possessivo) "mulheres" eram intelectualmente inferiores aos homens. Um dos argumentos era o de que o número de mulheres expoentes na literatura e artes em geral era muito inferior ao número de homens que se destacavam.
Para quem tem vontade de conhecer mais sobre críticas tecidas pela escritora a às condições dela enquanto mulher e escritora e sobre constrições sofridas por qualquer mulher de sua época, recomendo a leitura de "Profissões para mulheres e outros artigos feministas" (2012), publicado pela L&PM Pocket.
Em 1920, o romancista inglês Arnold Bennett publicou uma coletânea de ensaios chamada "Nossas mulheres: capítulos sobre a discórdia entre os sexos", na qual defendia que "as" (artigo definido e no plural, enquanto o título apresenta o pronome possessivo) "mulheres" eram intelectualmente inferiores aos homens. Um dos argumentos era o de que o número de mulheres expoentes na literatura e artes em geral era muito inferior ao número de homens que se destacavam.
Por sorte, Virginia Woolf já existia nessa época e não conseguiu se calar diante de tal afirmação.
Selecionei a última frase de uma
tréplica da escritora, publicada no jornal New Statement,
que, para mim, demonstra o quanto essa mulher foi sábia ao usar seu talento em se comunicar.
"(…) o que é necessário não é
apenas a educação. É que as mulheres tenham liberdade de experiência, possam
divergir dos homens sem receio e expressar claramente suas diferenças (…); que
todas as atividades mentais sejam incentivadas para que sempre exista um núcleo
de mulheres que pensem, inventem, imaginem e criem com a mesma liberdade dos
homens e, como eles, não precisem recear o ridículo e a condescendência. Essas
condições, a meu ver, muito importantes, são dificultadas por declarações como
as de Falcão Afável e Mr. Bennett, pois para um homem ainda é muito mais fácil
do que para uma mulher dar a conhecer suas opiniões e vê-las respeitadas. Não
tenho dúvidas de que, caso tais opiniões prevaleçam no futuro, continuaremos
num estado de barbárie semicivilizada. Pelo menos é assim que defino a
perpetuação do domínio de um lado e, de outro, da servilidade. Pois a
degradação de ser escravo só se equipara à degradação de ser senhor.
Atenciosamente, Virgínia Woolf."Para quem tem vontade de conhecer mais sobre críticas tecidas pela escritora a às condições dela enquanto mulher e escritora e sobre constrições sofridas por qualquer mulher de sua época, recomendo a leitura de "Profissões para mulheres e outros artigos feministas" (2012), publicado pela L&PM Pocket.
06 dezembro 2013
08 novembro 2013
como é fácil se equivocar e chamar de sagacidade suspeitas sobre o sentido que o outro dá às coisas... ações são sempre pontinhas de iceberg de subjetividades que cada um traz à visibilidade do jeito que lhe é possível ou oportuno... suspeitas são suspeitas e sagacidade é conseguir perguntar ao outro se fazem sentido as elocubrações. o resto é delírio, que pode ou não servir ao deleite.
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